Estava lendo um relatório publicado em setembro de 2018, com
o título “The future delivery/business models for Smart Home Services and
Infrastructure” (talvez traduzido como “Os futuros modelos de negócios para
Serviços e Infraestrutura de uma Casa
Inteligente”). Este relatório é de autoria de Roberta Gamble, da Frost
& Sullivan, e foi publicado pela CABA (Continental Automation Buildings
Association), à qual a AURESIDE é filiada.
Este relatório é claramente sobre o mercado americano, mas
podemos tirar algumas informações interessantes que, talvez, mostrem o futuro
brasileiro deste mercado da Casa
Inteligente.
Ele analisa a possibilidade/necessidade do mercado da Casa Inteligente evoluir para o modelo
de “Smart Home as a Service” (SHAaS – Casa
Inteligente como um Serviço). O que o relatório se propõe é analisar a
viabilidade e o interesse do público em pagar mensalmente pelos serviços de Casa Inteligente ao invés de investir e
possuir os equipamentos envolvidos.
O relatório toca em pontos importantes que podem ser
adaptados para a realidade brasileira, contudo, ele pressupõe que o prestador
deste serviço seja capaz de arcar com os investimentos em equipamentos e
infraestrutura para que possa cedê-los ao cliente final em troca de pagamentos
mensais.
Não acredito que esta abordagem seja viável no Brasil, pelo
menos não para a maioria das empresas que possam se interessar pelo mercado.
Até mesmo as grandes provedoras de serviço de TV e Internet não têm colocado um
empenho sério em modelar e abrir este tipo de oportunidade.
Mas alguns pontos que valem a pena serem relatados.
Primeiramente precisamos entender que no mercado americano o conceito de Casa Inteligente é bem genérico e antigo. Qualquer equipamento que dê uma cara de automação começa a definir o que eles chamam de “smart home”; até mesmo um sistema de alarme que use a Internet e se comunique com um aplicativo é uma instalação “smart home”.
Lá, o mercado que era predominantemente formado por imóveis
de luxo com muitos dispositivos recentemente ganhou momentum com a entrada da
possiblidade de soluções muito mais simples que permitem que uma casa se torne
inteligente aos poucos.
Então, o mercado americano mais que sofrer uma mudança,
ganhou uma nova fatia, o que abre novas oportunidades para toda a cadeia
produtiva, incluindo fabricantes, empresas de telecom, lojas de produtos
eletrônicos Do-It-Yourself (DIY) e desenvolvedores de aplicativos.
Já aqui no Brasil o mercado da Casa Inteligente está sendo visto como algo novo. E esta
perspectiva é resultado de um conjunto de fatores. Primeiramente, a utilização
de sistemas de vigilância monitorados remotamente nunca teve a cara de “smart
home”, sendo apenas uma prestação de serviço com uso de um pouco de tecnologia.
Os sistemas mais tradicionais não se difundiram enormemente pois são caros e
seus benefícios ainda não são muito bem reconhecidos no potencial mercado
comprador.
Os dispositivos para a Casa
Inteligente estão aparecendo no mercado brasileiro apenas agora em 2019,
com as iniciativas da Amazon e do Google de entrar de vez aqui. Eles ainda são
escassos e ainda são caros, mas estão presentes. E seus preços terão que se
alinhar melhor com a expectativa do mercado, uma vez que as referências de preços
internacionais irão fazer uma pressão no mercado brasileiro.
Assim, mais que uma fatia adicional no mercado existente, eu
considero que a Casa Inteligente
abre um mercado totalmente novo, que pode ser coberto por players existentes,
tanto na fabricação quanto na integração, mas que exigirá novos modelos de
negócios. E os modelos para integradores passam, obrigatoriamente, pelo
entendimento que a receita deverá vir majoritariamente da prestação de
serviços; e se ela for recorrente o sucesso do negócio estará facilitado. Já
para o fabricante, a parcela de serviços passa a ser importante pois seus
produtos exigirão no mínimo um aplicativo e uma plataforma, o que incorrerá em
custos recorrentes.
A definição do mercado tem evoluído à medida que as vontades
do consumidor tem mudado. As principais tendências levantadas pela Frost &
Sullivan no mercado americano nos últimos anos indicam:
- As áreas de foco mais tradicionais tem sido gerenciamento de energia, automação residencial, entretenimento e segurança.
- Outras áreas têm ganhado visibilidade como saúde e bem-estar. O envelhecimento da população tem sido o principal fator.
- A área de segurança irá crescer e incluir a segurança cibernética já que mais e mais dispositivos estão se conectando e são passiveis de ataques.
- O mercado está muito fragmentado com centenas de dispositivos e dezenas de plataformas para conectar estes dispositivos.
- Há uma clara tendência a produtos DIY, facilitado pelo esforço dos desenvolvedores em simplificar o processo de instalação e integração.
O mercado brasileiro de automação residencial tem seu foco
no trinômio economia-segurança-conforto e são, em geral tratados em conjunto,
diferentemente do mercado americano que costuma tratar cada um separadamente.
Quando pensamos no mercado brasileiro da Casa Inteligente ainda é cedo para
determinar quais focos os usuários destacarão. Com certeza, a preocupação com a
segurança, tanto pessoal quanto patrimonial ou cibernética, será um foco muito
forte no nosso mercado. E eu destaco que este foco é um grande incentivador da
contratação de serviços recorrentes por parte do cliente, já que um sistema de
segurança precisa de constantes verificações de sua eficiência e eficácia e,
com a tecnologia digital, constantes atualizações de proteções, firmwares e
softwares.
Já o aspecto DIY não deverá evoluir no mercado brasileiro
como evoluiu no americano. Ele será mais do tipo Do-It-For-Me (Faça Para Mim),
onde o usuário compra mas precisa ou prefere pedir ajuda a terceiros (amigos ou
profissionais) para a instalação e uso correto.
Um estudo de 2016 da Frost & Sullivan indicou que 38%
das residências nos Estados Unidos e Canadá já possuíam algum tipo de solução
voltada à Casa Inteligente. O mesmo
estudo indicou que nenhuma marca ou solução tinha uma penetração maior que 20%
no mercado americano. Na visão da Frost & Sullivan isso indica um mercado
com clientes interessados e com pouca dominância de uma marca, o que seria uma
receita ideal para crescimento continuado do mercado.
Contudo, alguns desafios
foram levantados durante uma pesquisa junto aos potenciais usuários:
- Preocupação com custo e segurança
- A percepção de custo, onde custos iniciais de instalação e custos indiretos como tempo, esforço e risco, parecem pesar mais que os benefícios prometidos. Também na lista estava a preocupação com custos de manutenção.
- Há ainda a preocupação com a segurança, mais especificamente o acesso não autorizado a informações pessoais e à vulnerabilidade das redes de comunicação da Casa Inteligente.
- Uma última preocupação de destaque é com falhas dos sistemas da Casa Inteligente.
Os números aplicáveis ao mercado brasileiro da Casa Inteligente ainda são uma
incógnita, mas seguramente serão expressivos se levarmos a sério as
preocupações do usuário brasileiro, que são bem semelhantes às do americano,
apontadas acima.
Para que estas preocupações quanto à segurança de dados deixem
de ter importância precisamos de fabricantes e prestadores de serviço
capacitados a cuidar destes assuntos de forma séria e profissional, talvez
suportados por algum tipo de certificação ou aprovação.
Já quanto aos preços, esta equação é um pouco mais
complicada de ser resolvida, mas acredito numa tendência de baixa guiada por
dois movimentos: a internacionalização de nossos fabricantes locais, aumentando
seu mercado e volume de vendas, e a entrada de fabricantes internacionais que
conseguirão ajudar a balizar valores aceitáveis para o consumidor em geral.
O relatório insiste, ainda, no modelo de receitas
recorrentes que incluam o aluguel de equipamentos. Não acredito que isto se
torne viável no Brasil em uma escala aceitável, pois precisaríamos de prestadores
de serviços muito capitalizados. Isto restringiria o mercado a poucos e tiraria
do usuário o atendimento customizado que ele precisa. Afinal, mesmo com toda a
facilidade de compra e variedade de equipamentos que haverá no mercado, nenhuma
Casa Inteligente é igual à outra. O cliente
pedirá por um prestador de serviços mais presente, mais inteirado e mais dele,
mesmo que o cliente tenha que investir na compra de equipamentos.
Lembremos, ainda, que vários dispositivos que formam a Casa Inteligente são equipamentos como
geladeiras, fogões, fechaduras e aparelhos de ar condicionado, onde se torna
inviável a ideia de aluguel.
Com essas tendências vem novas necessidades: melhor
infraestrutura de Internet e WiFi, mais busca pela praticidade para melhorar o
uso do tempo, maior interesse em recursos como acompanhamento de parâmetros de
saúde e bem-estar (principalmente para os idosos) e mais serviços que venham
até a casa, como compras online e meios de transporte.
Com isso as pessoas vão passar mais tempo em suas casas e
terão o interesse em aumentar o nível de conforto e praticidade que a casa pode
oferecer, investindo em ter uma Casa
Inteligente.
Acredito que iremos ver comportamentos semelhantes no
mercado brasileiro, mas não serão determinantes para o morador sentir interesse
em tornar sua casa mais inteligente. Sua principal motivação será a busca de
praticidade. Haverá uma tendência de pessoas solteiras ou casadas sem filhos a
morar nos centros urbanos visando diminuir o stress das viagens diárias casa-trabalho-casa.
Isso implicará em espaços de moradia menores, mas com todas as facilidades tecnológicas
possíveis para diminuir despesas (mão de obra de terceiros e eletricidade
principalmente) e aumentar a disponibilidade de tempo para tarefas não relacionadas
com a manutenção e limpeza da residência.
O relatório apresenta também uma análise geográfica, econômica
e social de fatores que poderiam motivar o morador e avaliar os benefícios de
uma Casa Inteligente com custo
mensal ao invés de um investimento único inicial.
Contudo, o que mais chama a atenção no relatório é a
percepção de que o cliente seria naturalmente reativo a esse novo modelo e que haveria
a necessidade de buscar formas de convencê-lo das vantagens, mudar o seu “mindset”,
ou até mesmo “ludibriá-lo”, acrescentando a automação a serviços como TV a cabo
e internet, quase sem ele perceber.
Já no Brasil, a motivação deverá partir do próprio morador e
os atuais fabricantes, integradores e prestadores de serviços deverão saber se
adaptar. A motivação será causada por um conjunto de fatores que inclui:
- Menor investimento inicial
- Curva de aprendizado, começando quase como se fosse um brinquedo tecnológico
- Alta integração com as ferramentas atuais, com das quais o morador já é dependente: smartphones, Internet, Nuvem...
- Ar de modernidade
- Benefícios imediatos
Estes motivos farão com que o morador se interesse em tornar
sua Casa Inteligente. Pelo seu próprio
perfil de curiosidade, este morador fará pesquisas e conhecerá o que está
acontecendo lá fora e quanto isso custa. E tentará replicar aqui o que ele viu
que pode ser feito lá fora.
Isso implicará em busca de menores preços sobre os produtos,
inviabilizando as margens de revenda que o integrador hoje pratica.
Mas este mesmo morador estará pronto a pagar pela experiência
e conhecimento de profissionais que o ajudarão a fazer as melhores escolhas e
tirar o melhor proveito do que está comprando. Ele não quer pegar numa chave de
fenda ou entender a diferença entre fase, neutro e terra. Ele quer que
funcione, que lhe traga benefícios, que lhe pareça ter pago um preço justo e
quer ter a certeza de ter contrato profissionais adequados, mesmo sabendo que
há um custo nisso.
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Quer saber mais como funcionaria um Smart Home as a Service –
SHAaS no Brasil?
Leia este post publicado no nosso blog: clique aqui.
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