11 maio 2019

Smart Home As a Service - USA vs BRASIL


Estava lendo um relatório publicado em setembro de 2018, com o título “The future delivery/business models for Smart Home Services and Infrastructure” (talvez traduzido como “Os futuros modelos de negócios para Serviços e Infraestrutura de uma Casa Inteligente”). Este relatório é de autoria de Roberta Gamble, da Frost & Sullivan, e foi publicado pela CABA (Continental Automation Buildings Association), à qual a AURESIDE é filiada.

Este relatório é claramente sobre o mercado americano, mas podemos tirar algumas informações interessantes que, talvez, mostrem o futuro brasileiro deste mercado da Casa Inteligente.

Ele analisa a possibilidade/necessidade do mercado da Casa Inteligente evoluir para o modelo de “Smart Home as a Service” (SHAaS – Casa Inteligente como um Serviço). O que o relatório se propõe é analisar a viabilidade e o interesse do público em pagar mensalmente pelos serviços de Casa Inteligente ao invés de investir e possuir os equipamentos envolvidos.

O relatório toca em pontos importantes que podem ser adaptados para a realidade brasileira, contudo, ele pressupõe que o prestador deste serviço seja capaz de arcar com os investimentos em equipamentos e infraestrutura para que possa cedê-los ao cliente final em troca de pagamentos mensais.

Não acredito que esta abordagem seja viável no Brasil, pelo menos não para a maioria das empresas que possam se interessar pelo mercado. Até mesmo as grandes provedoras de serviço de TV e Internet não têm colocado um empenho sério em modelar e abrir este tipo de oportunidade.

Mas alguns pontos que valem a pena serem relatados.

Primeiramente precisamos entender que no mercado americano o conceito de Casa Inteligente é bem genérico e antigo. Qualquer equipamento que dê uma cara de automação começa a definir o que eles chamam de “smart home”; até mesmo um sistema de alarme que use a Internet e se comunique com um aplicativo é uma instalação “smart home”.

Lá, o mercado que era predominantemente formado por imóveis de luxo com muitos dispositivos recentemente ganhou momentum com a entrada da possiblidade de soluções muito mais simples que permitem que uma casa se torne inteligente aos poucos.

Então, o mercado americano mais que sofrer uma mudança, ganhou uma nova fatia, o que abre novas oportunidades para toda a cadeia produtiva, incluindo fabricantes, empresas de telecom, lojas de produtos eletrônicos Do-It-Yourself (DIY) e desenvolvedores de aplicativos.

Já aqui no Brasil o mercado da Casa Inteligente está sendo visto como algo novo. E esta perspectiva é resultado de um conjunto de fatores. Primeiramente, a utilização de sistemas de vigilância monitorados remotamente nunca teve a cara de “smart home”, sendo apenas uma prestação de serviço com uso de um pouco de tecnologia. Os sistemas mais tradicionais não se difundiram enormemente pois são caros e seus benefícios ainda não são muito bem reconhecidos no potencial mercado comprador.

Os dispositivos para a Casa Inteligente estão aparecendo no mercado brasileiro apenas agora em 2019, com as iniciativas da Amazon e do Google de entrar de vez aqui. Eles ainda são escassos e ainda são caros, mas estão presentes. E seus preços terão que se alinhar melhor com a expectativa do mercado, uma vez que as referências de preços internacionais irão fazer uma pressão no mercado brasileiro.

Assim, mais que uma fatia adicional no mercado existente, eu considero que a Casa Inteligente abre um mercado totalmente novo, que pode ser coberto por players existentes, tanto na fabricação quanto na integração, mas que exigirá novos modelos de negócios. E os modelos para integradores passam, obrigatoriamente, pelo entendimento que a receita deverá vir majoritariamente da prestação de serviços; e se ela for recorrente o sucesso do negócio estará facilitado. Já para o fabricante, a parcela de serviços passa a ser importante pois seus produtos exigirão no mínimo um aplicativo e uma plataforma, o que incorrerá em custos recorrentes.

A definição do mercado tem evoluído à medida que as vontades do consumidor tem mudado. As principais tendências levantadas pela Frost & Sullivan no mercado americano nos últimos anos indicam:
  • As áreas de foco mais tradicionais tem sido gerenciamento de energia, automação residencial, entretenimento e segurança.
  • Outras áreas têm ganhado visibilidade como saúde e bem-estar. O envelhecimento da população tem sido o principal fator.
  •  A área de segurança irá crescer e incluir a segurança cibernética já que mais e mais dispositivos estão se conectando e são passiveis de ataques.
  •  O mercado está muito fragmentado com centenas de dispositivos e dezenas de plataformas para conectar estes dispositivos.
  •  Há uma clara tendência a produtos DIY, facilitado pelo esforço dos desenvolvedores em simplificar o processo de instalação e integração.

O mercado brasileiro de automação residencial tem seu foco no trinômio economia-segurança-conforto e são, em geral tratados em conjunto, diferentemente do mercado americano que costuma tratar cada um separadamente.

Quando pensamos no mercado brasileiro da Casa Inteligente ainda é cedo para determinar quais focos os usuários destacarão. Com certeza, a preocupação com a segurança, tanto pessoal quanto patrimonial ou cibernética, será um foco muito forte no nosso mercado. E eu destaco que este foco é um grande incentivador da contratação de serviços recorrentes por parte do cliente, já que um sistema de segurança precisa de constantes verificações de sua eficiência e eficácia e, com a tecnologia digital, constantes atualizações de proteções, firmwares e softwares.

Já o aspecto DIY não deverá evoluir no mercado brasileiro como evoluiu no americano. Ele será mais do tipo Do-It-For-Me (Faça Para Mim), onde o usuário compra mas precisa ou prefere pedir ajuda a terceiros (amigos ou profissionais) para a instalação e uso correto.

Um estudo de 2016 da Frost & Sullivan indicou que 38% das residências nos Estados Unidos e Canadá já possuíam algum tipo de solução voltada à Casa Inteligente. O mesmo estudo indicou que nenhuma marca ou solução tinha uma penetração maior que 20% no mercado americano. Na visão da Frost & Sullivan isso indica um mercado com clientes interessados e com pouca dominância de uma marca, o que seria uma receita ideal para crescimento continuado do mercado.

Contudo, alguns desafios foram levantados durante uma pesquisa junto aos potenciais usuários:
  • Preocupação com custo e segurança
  • A percepção de custo, onde custos iniciais de instalação e custos indiretos como tempo, esforço e risco, parecem pesar mais que os benefícios prometidos. Também na lista estava a preocupação com custos de manutenção.
  • Há ainda a preocupação com a segurança, mais especificamente o acesso não autorizado a informações pessoais e à vulnerabilidade das redes de comunicação da Casa Inteligente.
  • Uma última preocupação de destaque é com falhas dos sistemas da Casa Inteligente.
Os números aplicáveis ao mercado brasileiro da Casa Inteligente ainda são uma incógnita, mas seguramente serão expressivos se levarmos a sério as preocupações do usuário brasileiro, que são bem semelhantes às do americano, apontadas acima.

Para que estas preocupações quanto à segurança de dados deixem de ter importância precisamos de fabricantes e prestadores de serviço capacitados a cuidar destes assuntos de forma séria e profissional, talvez suportados por algum tipo de certificação ou aprovação.

Já quanto aos preços, esta equação é um pouco mais complicada de ser resolvida, mas acredito numa tendência de baixa guiada por dois movimentos: a internacionalização de nossos fabricantes locais, aumentando seu mercado e volume de vendas, e a entrada de fabricantes internacionais que conseguirão ajudar a balizar valores aceitáveis para o consumidor em geral.

O relatório insiste, ainda, no modelo de receitas recorrentes que incluam o aluguel de equipamentos. Não acredito que isto se torne viável no Brasil em uma escala aceitável, pois precisaríamos de prestadores de serviços muito capitalizados. Isto restringiria o mercado a poucos e tiraria do usuário o atendimento customizado que ele precisa. Afinal, mesmo com toda a facilidade de compra e variedade de equipamentos que haverá no mercado, nenhuma Casa Inteligente é igual à outra. O cliente pedirá por um prestador de serviços mais presente, mais inteirado e mais dele, mesmo que o cliente tenha que investir na compra de equipamentos.

Lembremos, ainda, que vários dispositivos que formam a Casa Inteligente são equipamentos como geladeiras, fogões, fechaduras e aparelhos de ar condicionado, onde se torna inviável a ideia de aluguel.

O relatório analisa também a mudança no comportamento de utilização das residências. A cada dia temos mais pessoas trabalhando em casa (home office), mais pessoas idosas querendo continuar a ter sua vida independente, mais pessoas abandonando o uso de automóveis. A casa está se tornando em um centro de vivência para as pessoas e famílias.

Com essas tendências vem novas necessidades: melhor infraestrutura de Internet e WiFi, mais busca pela praticidade para melhorar o uso do tempo, maior interesse em recursos como acompanhamento de parâmetros de saúde e bem-estar (principalmente para os idosos) e mais serviços que venham até a casa, como compras online e meios de transporte.

Com isso as pessoas vão passar mais tempo em suas casas e terão o interesse em aumentar o nível de conforto e praticidade que a casa pode oferecer, investindo em ter uma Casa Inteligente.

Acredito que iremos ver comportamentos semelhantes no mercado brasileiro, mas não serão determinantes para o morador sentir interesse em tornar sua casa mais inteligente. Sua principal motivação será a busca de praticidade. Haverá uma tendência de pessoas solteiras ou casadas sem filhos a morar nos centros urbanos visando diminuir o stress das viagens diárias casa-trabalho-casa. Isso implicará em espaços de moradia menores, mas com todas as facilidades tecnológicas possíveis para diminuir despesas (mão de obra de terceiros e eletricidade principalmente) e aumentar a disponibilidade de tempo para tarefas não relacionadas com a manutenção e limpeza da residência.

O relatório apresenta também uma análise geográfica, econômica e social de fatores que poderiam motivar o morador e avaliar os benefícios de uma Casa Inteligente com custo mensal ao invés de um investimento único inicial.

Contudo, o que mais chama a atenção no relatório é a percepção de que o cliente seria naturalmente reativo a esse novo modelo e que haveria a necessidade de buscar formas de convencê-lo das vantagens, mudar o seu “mindset”, ou até mesmo “ludibriá-lo”, acrescentando a automação a serviços como TV a cabo e internet, quase sem ele perceber.

Já no Brasil, a motivação deverá partir do próprio morador e os atuais fabricantes, integradores e prestadores de serviços deverão saber se adaptar. A motivação será causada por um conjunto de fatores que inclui:
  • Menor investimento inicial
  • Curva de aprendizado, começando quase como se fosse um brinquedo tecnológico
  • Alta integração com as ferramentas atuais, com das quais o morador já é dependente: smartphones, Internet, Nuvem...
  • Ar de modernidade
  • Benefícios imediatos

Estes motivos farão com que o morador se interesse em tornar sua Casa Inteligente. Pelo seu próprio perfil de curiosidade, este morador fará pesquisas e conhecerá o que está acontecendo lá fora e quanto isso custa. E tentará replicar aqui o que ele viu que pode ser feito lá fora.

Isso implicará em busca de menores preços sobre os produtos, inviabilizando as margens de revenda que o integrador hoje pratica.

Mas este mesmo morador estará pronto a pagar pela experiência e conhecimento de profissionais que o ajudarão a fazer as melhores escolhas e tirar o melhor proveito do que está comprando. Ele não quer pegar numa chave de fenda ou entender a diferença entre fase, neutro e terra. Ele quer que funcione, que lhe traga benefícios, que lhe pareça ter pago um preço justo e quer ter a certeza de ter contrato profissionais adequados, mesmo sabendo que há um custo nisso.
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