Imaginemos nossa Cidade Inteligente. O que seria isso?
Roubando um pouco das informações e definições do Plano
Nacional da Internet das Coisas, Cidades seriam ambientes urbanos com serviços
públicos e utilities. Isso não define
muito, mas tenho certeza que todos temos uma visão bastante coesa do que seriam
Cidades.
O Plano Nacional apresenta vários casos onde o uso da Internet das Coisas e da inteligência pode
contribuir para trazer melhorias na qualidade de vida e otimizações no gerenciamento
da dinâmica de uma cidade. Os quadros abaixo foram produzidos durante o estudo
de preparação do Plano.
Vejamos, então, as principais áreas de atuação.
A. Otimização da utilização e disponibilidade
de energia elétrica.
B. Otimização da utilização e disponibilidade de
água tratada e esgoto.
C. Monitoração e otimização em tempo real da
mobilidade urbana.
D. Coleta Inteligente de Resíduos
E. Monitoramento da Qualidade do Ar
F. Segurança Pública e Patrimonial
Em linhas gerais, para que tudo isso possa ser implementado,
a Internet das Coisas é o elo
fundamental para se obter e disponibilizar as informações em tempo real e para
se atuar diretamente sobre os eventos, de forma a se conseguir os resultados
desejados. Vejam como o Plano Nacional “define” a IoT.
Como podemos ver, três grandes funcionalidades compõem a IoT: sensores e atuadores,
redes de comunicação e inteligência computacional.
A questão da inteligência computacional passa por momentos
de indefinição, mas está ficando claro que ela deve ser de alguma forma distribuída
entre processamento local e processamento na Nuvem.
A funcionalidade de redes de comunicação está em desenvolvimento
e tem apresentado soluções tanto utilizando redes existentes (redes celulares,
WiFi, Bluetooth, Zwave, ZigBee, etc.) quanto utilizando novos padrões como o LoRaWAN,
que visam mais especificamente as necessidades de comunicação de aplicações IoT.
O terceiro elemento, o conjunto de sensores e atuadores, tem
se desenvolvido mais rapidamente, mas os produtos finais ainda dependem da
melhor definição dos dois outros aspectos, já que este conjunto de sensores e
atuadores deverá se comunicar com as redes IoT e deverá ter alguma capacidade computacional, já que está
claro que haverá processamento local das informações.
Em todo caso, mesmo ainda não tendo todas as diretrizes
tecnológicas sacramentadas, devemos começar a pensar na implementação destas
tecnologias de forma a termos Cidades Inteligentes que tragam os benefícios
almejados.
Se deixarmos as coisas seguirem seu caminho natural, teremos
várias iniciativas localizadas e de escopo restrito. Cada órgão responsável por
alguma parte da gestão da cidade passará desenvolver sua própria ideia de como
implementar sistemas inteligentes baseados em IoT.
Teremos um sistema cuidando dos semáforos, com seus sensores
contando os veículos, medindo congestionamentos e monitorando o funcionamento
dos semáforos. Estes sensores e atuadores se comunicarão com um gateway local,
onde algum processamento como o cálculo de volume de tráfego e o controle do
equipamento semafórico será executado, e este gateway se comunicará com a Nuvem.
Esta, por sua vez, fará a coordenação geral do tráfego, se comunicando com
outros gateways espalhados pelas vias e, utilizando processamento de alto
nível, cuidará da fluidez do tráfego como um todo.
Este sistema inteligente, utilizando IoT, será gerenciado e operado pelo órgão
de trânsito da Cidade Inteligente, que responde ao Município.
A Defesa Civil, por outro lado, operará um outro sistema
inteligente composto de sensores meteorológicos, de nível de riachos e de umidade
do solo para antecipar possíveis riscos e alertar as populações envolvidas através
de mensagens e alarmes. Teremos, como consequência, outros conjuntos de
sensores e gateways se comunicando com a Nuvem e sendo gerenciado e operado pela
Defesa Civil, que pode ser em nível municipal, estadual ou federal.
Continuando no raciocínio, a companhia de distribuição de
energia elétrica terá um sistema de medidores inteligentes que monitorarão a
qualidade e o consumo de cada residência em tempo real, passando estas informações
à Nuvem, que controlará a demanda e disponibilidade do seu serviço.
Aqui teremos
outros conjuntos de sensores e atuadores, se utilizando de outros gateways para
se comunicar com a Nuvem, e gerenciado e operado por uma empresa privada,
concessionária do serviço, respondendo a órgãos municipal, estadual e federal.
Três sistemas, três conjuntos de sensores e atuadores, três tipos
de gateways... vários responsáveis pelo gerenciamento e operação... não muito
inteligente para uma Cidade Inteligente. Haverá um desperdício muito grande de
recursos com sistemas de comunicação subutilizados, nenhuma troca de
informações entre eles e nenhuma coordenação global de ações e geração de benefícios
para a população.
Tecnicamente, é plenamente possível integrarmos boa parte
destes três serviços, nos beneficiando do trabalho conjunto. Podemos ter
conjuntos de sensores e atuadores modulares espalhados pela cidade,
configurados individualmente conforme a necessidade local. Em um determinado cruzamento
da cidade, teríamos um único gateway conversando com sensores de tráfego e
sensores de chuva, enviando informações para as diversas aplicações específicas
na Nuvem. Este mesmo gateway conversaria ainda com os medidores inteligentes de
consumo de eletricidade e de água das residências mais próximas, passando as informações
para as Nuvens das concessionárias. Estas aplicações poderiam trocar
informações entre si, aumentando sua “inteligência”: teríamos a Defesa Civil
coordenando ações de socorro em emergências já com informações sobre as
condições de tráfego e com a possibilidade de alterar as configurações de fluxo
para facilitar evacuações ou chegadas das equipes de socorro onde necessário. Teríamos
a autoridade de trânsito recebendo informações em tempo real das condições meteorológicas
e de enchentes para melhor gerir a fluidez.
Infelizmente, a segregação atual de poderes, verbas e
responsabilidades, juntamente com os mais variados tamanhos de cidades, torna
esta integração impraticável. Contudo, não considerar esta integração desde o
início é buscar o caos tecnológico, a frustação na falta de resultados e o
desperdício de recursos. O caos na infraestrutura que hoje se vê nas redes aéreas,
seja de eletricidade, telefonia ou serviços de internet e TV a cabo, e nas
tubulações enterradas de eletricidade, telefonia, fibra ótica, água, esgoto e
gás só irá aumentar com a quantidade de sensores, atuadores e gateways que têm
que ser espalhados pela cidade.
Como fazer para evitar que este caos tome conta da
infraestrutura de IoT? A resposta a esta pergunta é complexa, mas algumas
diretrizes podem ajudar.
·
Sensores e atuadores devem ter sua conectividade
com gateways padronizada, de forma similar à que encontramos no controle de
processo industrial. Esta padronização deve permitir que eles sejam
intercambiáveis e que possam conversar com praticamente todos os gateways disponíveis
no mercado.
·
Os gateways devem ser modulares, permitindo que
sua configuração de hardware se adapte a cada aplicação. Sua alimentação, sua
comunicação com e sem fio, sua capacidade de comunicação com os sensores e
atuadores e sua capacidade computacional devem ter opções que lhes permitam ser
utilizados em praticamente qualquer local ou aplicação, escolhendo apenas os
módulos necessários. Devem, ainda, ser facilmente expansíveis, para que
qualquer novo serviço possa ser implementado como acréscimo de módulos ao
gateway.
·
A comunicação com a Nuvem deverá ser possível tanto
para os gateways quanto para alguns tipos de sensores. As opções de comunicação
devem seguir os vários padrões que serão consolidados no mercado. O uso de
comunicações redundantes deve estar disponível para aplicações críticas.
·
A Nuvem deve ser a plataforma de programação e
tratamento de dados que esteja pronta a conversar com os gateways e a
gerenciar, junto com eles, as opções de comunicação. Estas plataformas poderão oferecer
diferentes serviços computacionais, dando opções ao mercado conforme volume de
dados e tarefas a serem executadas.
·
A troca de informações entre as plataformas na
Nuvem deve ser plenamente possível, mesmo em tempo real. Deverá ser possível um
gateway obter informações de um sensor conectado a qualquer outro gateway
através da Nuvem, mesmo que estes gateways estejam conectados a plataformas
diferentes.
Estas diretrizes, ou algo similar, devem cobrir
razoavelmente bem os pontos técnicos e práticos para o plano de implementação
de Cidades Inteligentes. Contudo, elas não cobrem os aspectos não tecnológicos.
Há uma série de desafios relacionados com os órgãos públicos que devem ser
tratados corretamente e preventivamente para que a otimização dos recursos seja
alcançada.
Uma cidade está sob o controle principal do governo
municipal; contudo, as intervenções na cidade são também geradas pelos governos
estadual e federal, seja através de diretrizes, seja diretamente nas ações que
praticam no ambiente físico da cidade.
Para que evitemos os problemas causados pela falta de integração,
é necessário termos uma entidade paralela que direcione as iniciativas e
coordene as decisões. Suas principais responsabilidades seriam:
·
Documentar e detalhar as diretrizes técnicas para
que os fabricantes possam desenvolver produtos certificadamente integráveis
entre si.
·
Garantir que nenhuma iniciativa no âmbito da
cidade seja tomada sem o prévio conhecimento e integração com inciativas
anteriores.
·
Prestar consultoria às prefeituras para que preparem
suas estruturas administrativas para uso dos benefícios das tecnologias.
·
Coordenar eventuais usos de verbas públicas nas
iniciativas do Plano Nacional.
·
Colaborar para que as diretrizes do Plano
Nacional sejam seguidas pelas iniciativas de cada município.
Não quero aqui engessar ou controlar os esforços para a
implementação de tecnologias visando a Cidade Inteligente. Busco, com estas
ideias, proteger qualquer iniciativa do fracasso pelos custos descontrolados de
implementação ou pelo desvio do uso mais abrangente da Internet das Coisas, que é a interoperabilidade e intercomunicabilidade
dos equipamentos participantes.
Outro aspecto que precisa ser considerado e que será tratado
posteriormente é o desafio de tamanho de cada cidade. Como tratar uma São Paulo,
ou sua região metropolitana, como uma Cidade? A partir de qual tamanho uma
cidade poderá tirar proveito dos benefícios trazidos pela Internet das Coisas?
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